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Foto do escritorFrancisco Marques

Garrafa de cerveja vs cabeça

Atualizado: 20 de out.

Vamos discutir coisas sérias: se tivesses de levar com uma garrafa de cerveja na cabeça, preferias levar com a garrafa vazia ou cheia?


Bem, se calhar vamos começar pelo início. Então, não é que a primeira frase da introdução deste artigo é qualquer coisa de bestial? Vou traduzir: “ao examinar vítimas de lutas de bar, vivas ou falecidas, não é incomum na prática forense. Estas lutas são comummente desenroladas com punhos, pés, mobiliário e copos”. Bem, que descrição científica do que acontece quando dois marmanjos andam à porrada. Tudo se torna poético na ciência. Para além desta, também existe uma outra frase interessantíssima: “Na Suíça, a garrafa de meio litro de cerveja é, de acordo com a própria experiência dos autores, muito utilizada na disputa física entre pessoas”. Este “de acordo com a própria experiência dos autores” é fantástico, porque levanta a seguinte pergunta: "Como foi feito o brainstorming deste tópico?"


Num universo paralelo, estou a imaginar o líder do grupo de investigação a convocar uma reunião e a dizer o seguinte: “precisamos de averiguar, urgentemente (é sempre urgentemente), qual é a garrafa de cerveja mais utilizada nas agressões dentro de bares?” Olha para o estagiário e diz: “Fernando (não sei porque é que escolhi este nome, foi só porque “Fernando” parece-me um bom nome para estagiário) precisamos que dês esse input”.  E o “Fernando” o que é que faz? Será que vai percorrer os bares todos da cidade e esperar que ocorra confusão para anotar que tipo de garrafa de cerveja (caso seja uma garrafa de cerveja que venha à mão) o agressor usa para dar na vítima? E se for uma cidade calminha? Nem todas as cidades têm o Urban. Como é? E se o líder do grupo for uma pessoa impaciente e quiser os resultados para ontem? Será que o estagiário “Fernando”, ainda com dentes de leite e buço de 12 anos, vai aguentar a pressão? É que esperar eternamente que haja conflito, mais vale causar distúrbios de uma forma propositada só para ter material e dados para analisar. Já estou a imaginar o “Fernando” a andar meses de cabeça ligada, porque deu o corpo ou melhor a cabeça, em nome de algo maior como a ciência. Coitado do “Fernando”.


Mas bem, saindo deste universo paralelo, os autores confessam que a ideia de estudar o fenómeno de quebra de garrafas na cabeça surgiu durante uma audição em tribunal em que foram questionados se uma garrafa de cerveja conseguiria partir os ossos da cabeça e qual é que causaria um maior impacto: a garrafa vazia ou a garrafa cheia. E não é que estes patologistas tentaram mesmo responder a esta questão? Verdade. Pegaram em 10 garrafas (6 vazias e quatro cheias) de Feldschlösschen Brewery (uma marca suíça) e deixaram cair sobre elas uma bola de 1 kg de aço, partindo de diferentes alturas (de 2 a 4 m). Só um aparte: o número de garrafas testadas é ridículo. Os autores devem ter juntado as garrafas que tinham em stock em casa e somadas deram dez. Adiante. Os autores também verificaram que a espessura da garrafa variava. Há uma zona entre o meio e o final da garrafa que apresentava uma espessura mínima de 0,20 cm. Portanto, a bola embateu exatamente nesta zona. Relativamente aos resultados, é ridiculamente curto o que os autores dizem nesta secção. Portanto, meus meninos e minhas meninas preparem-se para ouvir a secção de resultados mais de ejaculação precoce escrita num artigo científico alguma vez publicado. Vou traduzir:

“As garrafas de cerveja toleraram energias até 25 J (n=2, ou seja, duas garrafas), mas rebentaram a 30 J (n=2), enquanto as garrafas vazias quebraram com energias de 40 J (n=4), mas não quebraram abaixo deste valor (n=2). Assim, as garrafas vazias aguentaram mais 10 J do que as garrafas cheias antes de quebrarem.” E estão feitos os resultados dum artigo científico. Qualquer criança que tenha tido Ciências Físico-químicas no 7º ano já descreveu com uma maior desenvoltura os resultados que obteve nas suas experiências do que estes autores formados em patologista clínica e/ou forense. Eu arrisco-me a dizer que deve ter sido o líder do grupo de investigação que pediu ao estagiário “Fernando” para escrever os resultados. Mas coitado do “Fernando”, não teve cabeça para mais.


Resumindo, as garrafas vazias custam mais a partir do que as garrafas cheias. E porquê? Será que os autores explicam? Explicam, pois. Descansem que não foi o “Fernando” que escreveu o artigo todo sozinho. Existem duas razões:

1) A cerveja é praticamente um fluido incompressível. Mesmo uma ligeira deformação da garrafa leva a um aumento da pressão interna e à sua destruição.

2) A cerveja é rica em dióxido de carbono. Este gás a determinadas pressões pode levar a que a garrafa expluda.


Bem, já podemos responder à pergunta levantada no início do vídeo. Eu, cá entre nós, prefiro levar com uma garrafa cheia. No entanto, não sei se isso me vai safar, uma vez que, segundo experiências protagonizadas usando cabeças de pessoas já falecidas (o “Fernando” estava de férias), aconteceram fraturas cranianas empregando uma energia entre 14,1 e 68,5 J. Portanto, tanto a garrafa vazia (40 J) como cheia (30 J) podem provocar lesões cranianas. Para acabar, os autores concluem que, e passo a traduzir: “estas garrafas de cerveja são, na verdade, uma arma formidável na disputa física” e que “são necessários mais estudos usando outros tipos de garrafas para avaliar a extensão dos danos cerebrais que podem provocar”. Já sabem a quem é que vai calhar a fava, não sabem? Coitado do “Fernando”.


Até à próxima.


(Estudo: Are full or empty beer bottles sturdier and does their fracture-threshold suffice to break the human skull?

Stephan A. Bolliger MD (Senior Forensic Pathologist)*, Steffen Ross MD (Radiologist), Lars Oesterhelweg MD (Forensic Pathologist), Michael J. Thali MD (Professor, Director, Forensic Pathologist), Beat P. Kneubuehl PhD (Physicist))

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